A disciplina de Planeamento territorial – independentemente da escala e da geografia em que se foque – está hoje, talvez mais do que nunca, em questão. As vivências urbanas sob o contexto pandémico do último ano, e o seu efeito no agravamento da desconfiança que a palavra “planeamento” vem gerando, põem-na genericamente em causa. O sentimento não é especificamente atinente a este campo de estudo, pois que globalmente as várias áreas do conhecimento estão a ser chamadas ao questionamento de premissas, valores e instrumentos. É a consequência dos tempos actuais, poder-se-á dizer. No entanto, mais do que outras, esta nossa disciplina é por ele afectada já que assenta de modo essencial no acto de planear, de programar o uso do solo por antecipação das dinâmicas de vida social, de desenhar o/um futuro para um determinado horizonte temporal. E este é dominado pela sensação de incerteza. Parece, pois, desaparecer a sua razão de existência na proporção da diminuição das “certezas”, o pressuposto que originalmente fundamentava a disciplina e garantia a materialização do plano em correspondência com elas. Urge então um renovado nexo disciplinar, o qual se vem construindo pela recusa de abandonar o compromisso com a sociedade e suspender a responsabilidade de idealizar e criar soluções que melhorem as condições de vida da(s) comunidade(s).

O conjunto de textos que integra o presente livro denota bem a amplitude de uma dinâmica/prática disciplinar que pesquisa vários caminhos de resposta na senda de um progresso cujo sentido ainda se tacteia. Os tópicos são diversos, como as estratégias de discussão, oscilando entre o pragmatismo e a maior abstracção. Também diversa é a geografia de filiação dos autores e a que referencia a investigação apresentada (Argentina, Brasil, Cuba, México, Panamá, Portugal), assim se provando a transversalidade daquela procura. Nenhuma se dirige especificamente ao contexto pandémico actual, mas todas discutem temas do século XXI, envolvendo os aspectos humanos e socioambientais de que depende a nossa subsistência no planeta. Questionando e implicando o território urbano à escala da cidade/região, respondem à chamada para repensar e actualizar a disciplina – nos temas, nos processos, nas ferramentas. O título do livro reflecte estes ensejo e desafio colocados ao Planeamento Urbano e Regional.

A divisão dos capítulos segundo dois argumentos – “Urbanização e Recursos Naturais” e “Urbanização e Formas de Ocupação” – interpreta a “urbanização”, o tópico comum, como um processo geral onde a edificação e a infra-estruturação estão implicadas, sem haver referência específica ao seu resultado formal. É neste enquadramento que se distinguem (nem sempre facilmente), por um lado, os trabalhos cuja essência é o foco na transformação dos recursos naturais/ambientais envolvidos na urbanização, e, por outro, aqueles que se fundamentam na indagação dos artefactos materiais (e.g. morfologias, etc.) produzidos no âmbito dos processos de urbanização.

A organização da obra, necessariamente subjectiva, propõe um princípio de leitura. Poderia ser outro. Se o leitor abrir o livro ao acaso e optar por esse distinto princípio de leitura, o seu título e âmbito estarão igualmente em consonância.

Sara Sucena